Uma das teclas que mais gostamos de bater aqui na FRN³ é a da democratização do e-commerce. Já falamos sobre como o seller center pode ser um facilitador para isso em outro artigo. Agora, queremos ressaltar como um modelo de distribuição pode acelerar essa digitalização: o aproveitamento das lojas físicas para fazer a última milha nas entregas.
Seria uma forma de reaproveitar o espaço desses estabelecimentos. Eles não seriam mais somente pontos de venda, mas também de envio e retirada de pedidos feitos pela internet.
É o conceito de omnichannel podendo ser explorado na prática. Com essa integração entre os ambientes físicos e virtuais, dá para otimizar toda a cadeia logística, a experiência de compra dos clientes e até os resultados dos lojistas que embarcam nessa estratégia.
Vamos explicar direitinho como funcionam as entregas de última milha, trazer os seus benefícios e mostrar como as empresas podem se adaptar a essa realidade.
O que é o last mile delivery?
O last mile ou última milha é a etapa final do envio de um pedido até a recepção do cliente. É quando um produto sai de um centro de distribuição até o endereço de entrega.
Trata-se da fase mais crucial em uma experiência de compra no e-commerce. É a hora que consumidor fica mais ansioso para receber a sua encomenda.
Por isso, as empresas buscam formas de dosar essa ansiedade e oferecer uma percepção positiva sobre a entrega. Elas costumam investir em formas de tornar o frete mais rápido, barato, transparente, inteligente e seguro para elas e para os clientes.
Tá, mas e onde entram as lojas físicas nessa história?
Elas se tornaram uma alternativa usada por grandes e-commerces para encurtar esse caminho entre os centros de distribuição e os consumidores.
É como se esses estabelecimentos se tornassem mini centros de distribuição nas cidades.
Se pensarmos que isso gera mais um ponto de parada para uma encomenda, pode parecer uma estratégia contraproducente.
Entretanto, é mais fácil transportar maiores volumes e quantidades de pacotes para poucos endereços (as lojas) do que separar um caminhão para sair de um armazém afastado das áreas urbanas para fazer muitas rotas, com entregas fracionadas para as casas dos clientes.
A partir das lojas, os envios podem ser feitos por veículos menores (como furgões, carros, motos ou bikes) ou podem ser armazenados por pouco tempo até serem retirados pelos compradores.
A Magazine Luiza talvez seja um dos melhores exemplos de aproveitamento das lojas da sua rede como mini CDs. Recentemente, anunciaram até a possibilidade de entrega em menos de 1 hora para 11 cidades brasileiras, justamente usando essa estrutura adaptada.
Somente estabelecimentos ligados a grandes redes fazem a última milha?
Não! O last mile não é algo que funciona somente nesse fluxo onde um produto sai de um grande armazém para uma loja do mesmo grupo no meio da cidade e dela para o cliente.
Sabe as entregas de produtos de grocery, alimentos e bebidas feitas por apps de delivery? Então, essa é outra forma de usar lojas físicas para isso.
O Rappi, iFood, Zé Delivery e Cornershop são exemplos de aplicativos que já transformam bares, restaurantes e supermercados em sellers e mini centros de distribuição.
Isso sem falar das empresas que criaram os seus próprios apps para viabilizar os pedidos feitos pelo e-commerce, como é o caso do Clube Extra.
Nesses casos, as próprias gôndolas das lojas podem funcionar como pontos de picking dos produtos (apesar de não ser o ideal, como falaremos mais adiante).
Esse processo de coleta pode ser feito por um funcionário daquele estabelecimento, que vai organizar o carrinho e levar para uma doca própria para os entregadores. Isso também pode ser realizado por um parceiro daquele app, que fará a compra e a levará para o cliente no endereço de entrega.
Também há casos nos quais shoppings centers e supermercados fazem dos seus estacionamentos locais para entrega e retirada de compras.
O Carrefour já testa esse modelo de drive thru por aqui desde 2018 e o Delivery Center vem ampliando a instalação de hubs logísticos em shoppings. Os dois modelos são formas de agilizar as coletas feitas por veículos. Para isso, são feitas pequenas modificações na estrutura desses estabelecimentos.
Como preparar as lojas físicas para essas modalidades de entrega?
Por aqui, vamos falar sobre dois modelos que necessitam de obras para mudar o desenho das lojas. Apesar disso, eles não são obrigatórios para quem quer usar seus pontos de venda para fazer o last mile próprio ou de parceiros, ok?
Tem muitas empresas aí que mantêm o mesmo layout. No máximo, elas criam um balcão para a retirada dos pedidos por clientes ou entregadores, mas com os produtos ainda saindo do estoque nos fundos da loja, da cozinha ou das próprias gôndolas no salão.
Não que misturar as coisas seja um erro. O problema é que isso, em maiores escalas de venda, pode trazer problemas relacionados a controle de estoque e abastecimento.
Por isso, vamos às configurações diferenciadas de lojas para o last mile:
Dark stores
Um conceito que vem sendo aplicado por algumas grandes redes é o de dark stores.
Nesses casos, as lojas convencionais são fechadas para o público e se tornam espaços exclusivos de armazenamento e coleta de produtos no meio das cidades.
A disposição dos produtos nas prateleiras é diferente. Eles são mais parecidos com os grandes armazéns focados nos estoques de e-commerces, com processos mais rápidos de checagem, seleção e despacho de produtos.
Isso pode funcionar bem para muitas empresas, sobretudo aquelas que entendem que vale a pena fechar o atendimento ao público para focar 100% em distribuição.
Tal transformação pode fazer sentido quando você tem, por exemplo, duas lojas localizadas na mesma região, onde uma canibaliza as vendas da outra. Nesse caso, se você também tiver um volume legal de pedidos feitos pela internet, pode ser interessante converter a loja física que menos vende em uma dark store.
Um problema dos estabelecimentos 100% transformados em dark stores é que eles perdem justamente as vendas feitas fisicamente, tirando uma opção para o público.
Portanto, é uma mudança que deve sempre ser avaliada com bastante cautela.
Lojas híbridas
Já outro conceito de reaproveitamento dos estabelecimentos é o de lojas híbridas.
Aqui, as lojas não deixam de ser pontos de venda. Elas modificam seus espaços para não misturarem as áreas de atendimento com as áreas de distribuição dos pedidos on-line.
Isso evita problemas como ruptura de estoque. Esse problema rola quando um produto da gôndola é usado para fazer o picking de um pedido da internet, correndo o risco de ser selecionado por um cliente pessoalmente antes, afetando a disponibilidade daquele item.
As lojas são divididas em áreas de vendas e em um hub logístico. Esse último espaço não é aberto para o público, que pode, no máximo, acessar um balcão de atendimento para fazer a retirada de um pedido armazenado naquele mini CD escondido. Já os entregadores e seus veículos costumam ter um acesso próprio, afastado dos corredores de atendimento.
Um problema do modelo híbrido é que o ponto de venda fica mais apertado, visto que ele passa a dividir espaço com uma dark store em outra área da loja.
No entanto, o cliente passa a ter acesso a mais serviços naquele estabelecimento.
Quais os benefícios do last mile para as lojas físicas?
Mudar o layout de uma loja e/ou a forma como ela opera pode ser algo muito trabalhoso. Portanto, as vantagens precisam ser bastante claras para quem pensa em modificar o seu espaço para otimizar as entregas ao público. Vamos entender esses benefícios a seguir:
Mais oportunidades de upselling e cross selling
Quando o cliente opta por retirar o produto na loja, esse espaço passa ter um fluxo maior de pessoas — e de maneira passiva, visto que a venda foi fechada em outro canal.
Com mais gente circulando pela loja, maiores as chances de acontecer uma compra adicional. Para isso, cabe ao lojista ou à sua matriz determinar estratégias para atrair o interesse do cliente que, a princípio, vai só para retirar um pedido.
Dá para pensar em um layout de loja onde o cliente tenha contato com boa parte das ofertas pelo caminho. Outra estratégia seria formular uma abordagem comercial dos vendedores e operadores de loja para tentar aumentar o valor daquele ticket.
Seja qual for o método aplicado, há ali uma oportunidade clara de complementar uma venda feita na internet.
Menor obstrução nos corredores
Ao não misturar os espaços de venda com os de distribuição, os corredores destinados ao atendimento ao cliente ficam mais livres.
Para o cliente físico, isso melhora o seu deslocamento e gera mais conveniência para analisar e escolher suas compras.
Os funcionários da loja responsáveis pela coleta das compras do e-commerce e os entregadores de aplicativos passam a ocupar outro espaço.
Eles operam no hub logístico, onde a seleção dos pedidos é mais objetiva e simplificada. Por exemplo, os produtos de maior saída costumam ser posicionados próximos às docas e em uma altura que não demande agachamentos ou uso de escadas. Afinal, o cliente do e-commerce quer uma entrega expressa, feita em minutos.
No fim, cada um fica no seu quadrado e a experiência em cada canal de compra pode ser otimizado — caso essa redução na área de vendas não prejudique os resultados da loja.
Parceria com outros canais de venda
Outra forma de monetizar com uma área de distribuição, oferecendo conveniência para o público no last mile, é usá-la como hub para outras empresas ou lojas da mesma rede.
Uma distribuidora de bebidas pode, por exemplo, reservar uma área do seu salão ou do seu estoque somente para pedidos feitos por apps como o Zé Delivery.
Já uma loja de produtos para pesca pode se integrar ao marketplace da Americanas e disponibilizar parte do seu estoque para as vendas realizadas pelo site.
Aos lojistas que usam o recurso de prateleira infinita, como tem na VTEX, dá para integrar o seu estoque ao inventário de outra loja parceira, mesmo que ela não tenha o produto à disposição na hora, fazendo com que o cliente não perca a compra.
Nesse modelo, a compra é efetuada em um estabelecimento, que fica com a comissão, mas o estoque usado é de outra loja, que recebe o repasse pelo valor do produto faturado.
O omnichannel abre inúmeras possibilidades de integrações. Você nem precisa ter um e-commerce próprio para usar sua loja como um ponto de envio ou retirada de produtos.
Mesmo exigindo um certo nível de digitalização das operações, a complexidade tecnológica não é das maiores. Isso certamente abre portas e democratiza as vendas.
Mas também não vamos negar que algumas das estratégias ligadas às entregas de última milha envolvem custos com obras, engenharias, comunicação e recursos humanos.
Isso pode até ser um impeditivo relevante. Entretanto, se há a vontade e a oportunidade de inovar, de gerar novas receitas e, principalmente, de criar uma experiência de entrega melhor para o seu público, o investimento valerá a pena.